México D.F.

22/02/2011 14:18

A excelente estrada para Cidade do México nos deixou rapidamente em nossa próxima parada. Pela estrada já era possível ver uma mudança no cenário, que parece que vai continuar desse jeito até os Estados Unidos.

Vegetação escassa, predominando gramados secos, de um amarelo-ouro, alternando com cactus, arbustos e árvores de troncos retorcidos, seja através de planícies ou subindo a montanha, lembrando muito os cenários de filmes americanos de faroeste.

Chegando a cidade, o panorama também muda. O trânsito caótico estressa, fazendo perder mais tempo nas ruas do que conhecendo a própria cidade. A poluição é visível, tingindo o céu azul de castanho e incomodando a respiração.

Conhecemos o Museu Nacional de Antropologia, que conta a história de todos os povos mexicanos, permitindo uma compreensão melhor dessa rica cultura que começamos a ter contato desde Chichen Itza.

Peças maias, aztecas, mexicas, olmecas, toltecas mostram que apesar da diversidade lingüistica, todos esses povos se pareciam, cultuando divindades similares, construindo as mesmas pirâmides com técnicas parecidas, mostrando que havia uma grande comunicação entre todos, através de extensas rotas comerciais.

Interessante ver também como, mesmo milhares e milhares de quilômetros de distância, culturas diferentes chegam aos mesmos rituais e crenças. O dilúvio é citado também pela história dos povos centro-americanos. O jogo de pelota, criado pelos olmecas, mas praticado por todos, representa a dualidade da luz e escuridão, dia e noite, bem e mal, em uma série de significados antagônicos lembrando muito conceitos taoístas de Yin e Yang.

O próprio moximon guatemalteco lembra muito uma versão maior e underground do Ekeko, tradicional boneco peruano, um dos mais tradicionais presentes trazidos por viajantes dos andes. As semelhanças incluem desde a tradição de colocar dinheiro e oferecer cigarros até o próprio detalhe do bigode fino sobre a boca.

Mas o que me surpreendeu foi ver a tradição de El Volador. Presente até mesmo em remotas tribos do interior da Amazônia, foi entre os teeneks mexicanos que encontrou sua excelência, sendo praticado como atração turística do lado de fora do museu. Do alto de um poste de mais de quarenta metros, quatro guerreiros com roupas representando águias, se jogam com cordas e vão descendo lentamente até o chão, de ponta-cabeça, rodando e rodando até desenrolar toda a corda. Enquanto isso, um quinto homem toca uma flauta através da parte mais alta do poste.

A cerimônia é um estímulo a fertilidade, representando a descida da chuvas à terra e a descida do deus-sol entre nós. O número de voltas mostra que também está intimamente relacionada ao calendário, com significados cósmicos e astrais.

Outra coisa curiosa é importância do milho para esse povo. Já tinha ouvido falar através de alguns amigos que para nós existem vários tipos de bananas: d´água, ouro, nanica, da terra, etc. Para os europeus, que recebem apenas bananas perfeitas, importadas, banana é apenas banana. Bem, no méxico, descobri que existe uma infinidade de milhos diferentes.

O amarelo é mais resistente à seca, apesar de não ser tão bem aproveitado pelo estômago. O branco é o preferido para confeccionar as famosas tortillas mexicanas. Já o milho roxo tem um gosto mais forte, utilizado para preencher recheios. E finalmente, o chamado milho de ciclo curto, mais nobre e de gosto mais refinado. Isso sem contar os nossos já conhecidos milho-verde e milho de pipoca.

O milho na verdade é tão importante que significa a própria origem do povo mexicano. Quetzalcoatl e seu irmão Xolotl, tentaram criar um homem que os pudesse venerar a partir da lama. Não deu certo, este se desfazia. Tentaram então com madeira, todavia eram desprovidos de alma. Finalmente, a partir do milho, conseguiram construir um homem capaz de venerá-lo e de construir uma civilização que dominaria toda a América por milhares de anos, até a chegada dos espanhóis.

Saímos da Cidade do México e fomos conhecer Teotihuacan, um complexo arqueológico inteiramente preservado, oriundo de diferentes culturas da região. Uma verdadeira metrópole do mundo antigo, somente perdendo em importância para Tenochtitlan, antiga capital azteca que veio se tornar a atual Cidade do México. Por conta dessa origem, os mexicanos contam com orgulho que vivem na capital mais antiga das Américas, fundada no século catorze, antes da chegada dos espanhóis.

A origem também é curiosa. Conta a lenda que os aztecas peregrinaram por duzentos anos através das matas mesoamericanas, procurando o lugar onde os deuses haviam dito que deveria ser construída sua capital: lá encontrariam uma águia com uma serpente no bico, pousada sobre um cactus que nasceria de uma pedra no meio de um lago.

E assim acharam a águia, no meio do lago Texcoco, que seria aterrado de forma a acomodar todos, no lugar onde até hoje está localizado o coração do país. É exatamente esse o símbolo desenhado no centro da bandeira mexicana.

Em Teotihuacan, a impressão que se tem é que todas as culturas mais antigas foram evoluindo para atingir sua excelência em tamanho e grandiosidade. Mas faltava aquela energia que sentimos em Tikal e Chichen Itza.

Os fenômenos acústicos aqui também existem, porém mais tímidos, como se a águia que respondesse as palmas a frente dos templos estivesse rouca. A maioria dos afrescos já foi retirada e colocada em museus. A entrada se inicia por uma grande praça, em frente ao templo de Quetzalcoatl, a serpente emplumada, formado por duas pirâmides uma atrás da outra.

Do alto do templo pode se visualizar toda a gigantesca cidadela, incluindo a grande praça, a calçada dos mortos que vai subindo lentamente até o local onde encontra-se a monumental Pirâmide do Sol, bem próxima da Pirâmide da Lua.

Para chegar às outras pirâmides, é preciso atravessar a longa Calzada de los Muertos, que em quatro quilômetros de discreta subida, vai retirando o ar que a mais de dois mil e quinhentos metros acima do mar, já está rarefeito. Pelo caminho, verifica-se que um dia ali existiram palácios e templos seguidos, indicando uma grande metrópole e um intenso centro comercial.

Chegando ao final, visualiza-se os sessenta e cinco metros de altura da Pirâmide do Sol, que observam solenes uma pequena praça a sua frente, além da Pirâmide da Lua, ao lado. Do alto, após recuperar o fôlego, tem-se a visão total de toda a região: quilômetros e quilômetros de planície preenchida apenas por arbustos rasteiros e cactus.

Apesar da grandiosidade e das características específicas de orientação astronômica – forma de receber a luz do sol nos solstícios, orientação ao pólo magnético da terra – a pirâmide não fornece nenhuma surpresa maior. Talvez o choque de ter conhecido Tikal e Chichen Itza antes tenha feito o monumento não ficar tão impressionante.

Uma das coisas que não entendi foi o fato de haver um morro próximo à cidadela. Se a intenção de monumentos tão altos era justamente ser melhor ouvido pelos deuses, por que não construir a pirâmide no alto do morro? Uma das versões para isso é que existe um túnel por baixo da pirâmide, originado por caminhos de lava vulcânica. Mostrando que a origem desse lugar remonta muito mais a morte do que a vida.

A cidade também é conhecida como cidade dos mortos. A verdade é que justamente pela imensa mistura de influências de todas as culturas, o local não parece tão original. Teotihuacan nos pareceu carregar uma energia pesada demais, principalmente após o cansaço do trânsito e poluição da Cidade do México.

            E acabou sendo onde nos despedimos do povo oriundo do milho, em direção ao trecho mais tenso da viagem: a passagem pela fronteira com os Estados Unidos. 

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